Um dos principais atrativos para a constituição de Holdings Familiares é a possibilidade de otimização da carga tributária sobre o patrimônio e seus rendimentos.
No entanto, a tributação de uma Holding não é inerentemente mais vantajosa em todas as situações;
ela depende crucialmente da estrutura adotada, do tipo de ativo administrado, do regime tributário escolhido (Lucro Presumido ou Lucro Real) e das operações realizadas.
Um planejamento tributário cuidadoso é essencial antes e depois da constituição da Holding para garantir que os benefícios fiscais sejam alcançados de forma lícita e sustentável, evitando questionamentos por parte do Fisco.
Este capítulo aborda os principais aspectos tributários a serem considerados em uma Holding Familiar no Brasil, focando nos impostos incidentes na integralização de bens, na gestão do patrimônio (receitas de aluguéis, venda de bens) e na distribuição de resultados aos sócios.
Tributos na Integralização de Bens A transferência de bens da pessoa física para a Holding (integralização de capital social) pode gerar incidência de impostos, dependendo do tipo de bem e do valor atribuído a ele:
ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis):
Regra Geral: A Constituição Federal (Art. 156, §2º, I) prevê a não incidência do ITBI sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, salvo se a atividade preponderante do adquirente (Holding) for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.
Atividade Preponderante: Considera-se atividade preponderante aquela que representa mais de 50% da receita operacional da pessoa jurídica nos 2 anos anteriores e nos 2 anos subsequentes à aquisição. Holdings recémconstituídas devem comprovar que não terão atividade imobiliária preponderante nos 3 primeiros anos.
Discussão: Existe uma importante discussão jurídica (Tema 796 do STF) sobre se a imunidade do ITBI na integralização alcançaria o valor dos bens que excede o capital social integralizado. O STF decidiu que a imunidade não alcança o valor excedente (valor da reserva de capital).
Conclusão Prática: Se a Holding não tiver atividade imobiliária preponderante, o ITBI não incide sobre o valor do imóvel utilizado para integralizar o capital social. Se houver ágio (valor do imóvel maior que o capital integralizado), o ITBI incidirá sobre esse ágio. Se a atividade for preponderantemente imobiliária, o ITBI incide sobre o valor total.
ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação):
Não incide na mera integralização de bens ao capital social, pois não se trata de doação nem transmissão causa mortis. Incidirá posteriormente se os sócios doarem suas quotas/ações aos herdeiros.
IRPF (Imposto de Renda Pessoa Física) - Ganho de Capital:
Opção de Avaliação: A Lei nº 9.249/95 (Art. 23) permite que a pessoa física transfira bens e direitos à pessoa jurídica, a título de integralização de capital, pelo valor constante na sua Declaração de Bens ou pelo valor de mercado.
Transferência pelo Valor da Declaração: Se a transferência for feita pelo mesmo valor que consta na Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF), não há ganho de capital a ser tributado pelo IRPF neste momento. A Holding registrará o bem pelo mesmo valor.
Transferência pelo Valor de Mercado: Se a transferência for feita por valor superior ao da DIRPF (valor de mercado), a diferença positiva é considerada ganho de capital para a pessoa física e estará sujeita à tributação pelo IRPF (alíquotas progressivas de 15% a 22,5%). A Holding registrará o bem pelo valor de mercado, o que pode ser vantajoso para futuras vendas pela pessoa jurídica (menor ganho de capital na PJ).
Escolha Estratégica: A decisão entre transferir pelo valor da declaração ou de mercado depende de um planejamento que considere a liquidez do sócio para pagar o IRPF agora versus a expectativa de venda futura do bem pela Holding e a tributação na PJ.
Tributação das Receitas da Holding Uma vez constituída, a Holding terá suas receitas tributadas conforme o regime escolhido (Lucro Presumido ou Lucro Real):
Lucro Presumido:
Aplicabilidade: Geralmente vantajoso para Holdings Patrimoniais com receitas de aluguéis e/ou venda de imóveis (que não sejam atividade principal) e receitas financeiras.
Base de Cálculo Presumida:
Aluguéis de Imóveis Próprios: Presunção de 32% sobre a receita bruta para IRPJ e CSLL.
Venda de Imóveis (não objeto principal): Presunção de 8% (IRPJ) e 12% (CSLL) sobre a receita bruta.
Rendimentos de Aplicações Financeiras: Tributação conforme regime específico (IRRF).
Dividendos Recebidos de Outras Empresas: Não entram na base de cálculo do Lucro Presumido (são isentos).
Alíquotas:
IRPJ: 15% sobre a base presumida (+ 10% adicional sobre o que exceder R$ 20.000/mês de lucro presumido). CSLL: 9% sobre a base presumida. PIS: 0,65% sobre a receita bruta (regime cumulativo).
COFINS: 3% sobre a receita bruta (regime cumulativo).
Carga Efetiva (Exemplo Aluguéis): A carga total de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS sobre receitas de aluguéis no Lucro Presumido fica em torno de 11,33% (sem considerar o adicional de IRPJ), o que é significativamente menor que os 27,5% do IRPF.
Lucro Real:
Aplicabilidade: Obrigatório para empresas com receita bruta anual superior a R$ 78 milhões ou com atividades específicas (ex: bancos). Pode ser vantajoso se a Holding tiver muitas despesas dedutíveis ou prejuízos fiscais.
Base de Cálculo: Lucro líquido contábil ajustado por adições e exclusões previstas na legislação fiscal.
Alíquotas:
IRPJ: 15% sobre o lucro real (+ 10% adicional sobre o que exceder R$ 20.000/mês).
CSLL: 9% sobre o lucro real.
PIS: 1,65% sobre a receita bruta (regime não cumulativo, permite créditos).
COFINS: 7,6% sobre a receita bruta (regime não cumulativo, permite créditos).
Complexidade: Exige contabilidade mais detalhada e controle de adições/ exclusões.
Tributação na Venda de Bens pela Holding Imóveis no Ativo Não Circulante (Investimento ou Imobilizado):
Lucro Presumido: O ganho de capital (diferença entre valor de venda e custo contábil) é adicionado integralmente à base de cálculo do IRPJ e da CSLL no trimestre da venda. A carga tributária sobre o ganho será de aproximadamente 34% (25% IRPJ + 9% CSLL).
Lucro Real: O ganho de capital compõe o lucro real, tributado pelas alíquotas normais (15% IRPJ + 10% Adicional + 9% CSLL).
Imóveis no Ativo Circulante (Estoque - Atividade Imobiliária):
Lucro Presumido: A receita bruta da venda é tributada com base nas presunções de 8% (IRPJ) e 12% (CSLL), resultando em uma carga de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS significativamente menor (em torno de 5,93% a 6,73%, dependendo do adicional de IRPJ).
Atenção: Classificar imóveis como estoque pressupõe atividade imobiliária, o que pode impactar a imunidade do ITBI na integralização.
Lucro Real: A receita da venda compõe a base de cálculo normal, sujeita às alíquotas de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS (não cumulativo).
Distribuição de Lucros aos Sócios
Dividendos: Os lucros apurados pela Holding (após pagamento de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS) e distribuídos aos sócios são, atualmente (Maio/2025), isentos de Imposto de Renda na Pessoa Física (IRPF).
Juros sobre Capital Próprio (JCP): A Holding (especialmente se tributada pelo Lucro Real) pode optar por remunerar seus sócios através de JCP, calculados sobre o Patrimônio Líquido e limitados a certos parâmetros. O JCP é dedutível da base de cálculo do IRPJ e da CSLL da Holding, mas é tributado na fonte a 15% de IRPF para o sócio.
Outros Tributos
IOF: Incide sobre operações financeiras, de crédito, câmbio e seguro.
Impostos Municipais e Estaduais: IPTU sobre imóveis urbanos, ITR sobre imóveis rurais, IPVA sobre veículos, ICMS/ISS se houver atividades comerciais/serviços (em holdings mistas).
Planejamento Tributário e Riscos
Legalidade: O planejamento tributário deve ser baseado em interpretações razoáveis da lei (elisão fiscal), evitando práticas artificiais ou simuladas que configurem evasão fiscal.
Propósito Negocial: As estruturas societárias devem ter um propósito negocial genuíno, além da mera economia de impostos, para reduzir riscos de questionamento pelo Fisco.
Subcapitalização e Preços de Transferência: Em holdings com operações internacionais, atenção às regras de subcapitalização e preços de transferência.
Reforma Tributária: Acompanhar as discussões sobre a Reforma Tributária, que podem impactar a tributação de dividendos, patrimônio e regimes fiscais.
Conclusão
A tributação é um fator chave na decisão de constituir e na gestão de uma Holding Familiar. Embora existam potenciais vantagens fiscais significativas, especialmente na tributação de aluguéis e na estrutura sucessória, é fundamental realizar um planejamento detalhado e contar com assessoria especializada para escolher o regime tributário adequado, avaliar os impactos na integralização e na venda de bens, e garantir a conformidade legal, minimizando riscos fiscais.
Referências
BRASIL. Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de
renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro
líquido, e dá outras providências.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Migalhas. Aspectos fiscais na constituição de holdings familiares (Tributário).
Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/403935/aspectos-fiscais-naconstituicao-
de-holdings-familiares-tributario
Jusbrasil. Tributação em uma Holding Familiar: Como cobram os impostos?.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/tributacao-em-uma-holdingfamiliar-
como-cobram-os-impostos/2731809360
Receita Federal do Brasil. Legislação e Manuais sobre IRPJ, CSLL, PIS, COFINS.
(Consultar site: https://www.gov.br/receitafederal/)
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